terça-feira, 11 de outubro de 2016

VALE DO LAPEDO - ANTIGAS FORMAS DE HONRAR A MORTE NO NOSSO TERRITÓRIO



SAMAIN aproxima-se...

O corpo foi embrulhado numa mortalha tingida com ocre vermelho e estendido na fossa, de costas e ligeiramente inclinado para a parede do abrigo. Junto ao pescoço foi recolhida uma concha tingida a ocre, que deveria fazer parte de um colar, e quatro dentes de veado na cabeça, que poderiam fazer parte de uma espécie de touca. A criança foi ainda enterrada com oferendas de carne de veado e com um filhote de coelho como última oferenda. Na cerimónia foi ainda queimada uma rama de pinheiro.
 
A mais antiga sepultura que se conhece em Portugal, e uma das mais antigas do mundo, a única do Paleolítico Superior até agora descoberta na Península Ibérica, com 24.500 anos, foi encontrada no final dos anos 90 no Abrigo do Lagar Velho, no Vale do Lapedo, junto da cidade  de Leiria. Pertencia a uma criança com entre 4 e 5 anos de idade, referida como o Menino do Lapedo, embora seja impossível determinar o seu género. Por isso prefiro chamar-lhe muito simplesmente a Criança do Lapedo. O fóssil desta criança, entretanto, revelou-se de extrema importância para o meio científico porque aparenta ter nascido do cruzamento do Homo (ou Femina) neanderthalensis com um Homo sapiens, o que revelaria que espécies diferentes de humanoides poderiam ter-se cruzado entre si e gerar descendentes. 

A hipótese de que os Neandertais desapareceram, não por extinção, mas por interacção entre eles e os Cro-Magnons, tendo sido assimilados, parece tornar-se plausível graças a esta descoberta. O sepultamento da criança, entretanto, foi feito de forma cerimonial uma vez que foi escavada uma pequena fossa e queimado um ramo de pinheiro. O corpo foi embrulhado numa mortalha tingida com ocre vermelho e estendido na fossa, de costas e ligeiramente inclinado para a parede do abrigo. Junto ao pescoço foi recolhida uma concha tingida a ocre, que deveria fazer parte de um colar, e quatro dentes de veado na cabeça, que poderiam fazer parte de uma espécie de touca. A criança foi ainda enterrada com oferendas de carne de veado.

Sabemos que a partir do 5º milénio a.C., as sociedades de pastores e agricultores construíram monumentos funerários, as ou dólmenes, de que são exemplo as antas de Belas e os sepulcros Megalíticos dos arredores da Figueira da Foz. A maior parte dos monumentos megalíticos que se conhecem em Portugal são sepulturas. Apresentam uma câmara poligonal de 5, 7 ou 9 esteios, cobertos com uma grande laje ou chapéu, um corredor de comprimento variável, com esteios mais pequenos e também cobertos com lajes, numa nítida representação do útero da Deusa que acolhe as Suas filhas e filhos na morte. Do século III AC, no Calcolítico, no sul do país a construção megalítica é substituída pela técnica de falsa cúpula, dando origem às chamadas tholos, que podemos ver na necrópole de Alcalar, concelho de Portimão, um monumento funerário muito semelhante a Newgrange, na Irlanda.
Também as mamoas, designação dada pelos ocupantes romanos a estas sepulturas megalíticas monumentais, semelhantes a um seio de mulher, também usadas pelas comunidades neolíticas para enterrarem as suas mortas e os seus mortos. Estes monumentos funerários devem ter tido um significado simbólico importante e devem ter sido sobretudo «túmulos para os vivos», como disse um autor britânico (tomb for the living). Ou seja, destinavam-se provavelmente mais aos vivos do que aos mortos. E é possível que cada núcleo ou grupo de mamoas correspondesse aos antepassados míticos de uma determinada família ou linhagem, facultando-lhe uma referência para a sua identidade, leio na Wikipedia, onde também se afirma que “O dólmen, escondido debaixo de uma colina artificial (a mamoa), era como um «útero» abrigado do olhar, onde se colocavam relíquias «no interior da terra». Podemos imaginar que essa deposição de relíquias funerárias seria, a nível de significação simbólica, como que um regresso do ser humano ao útero materno da Terra Mãe”.
Várias ainda foram as grutas sepulcrais, grutas usadas como lugar de enterramento, desta feita uma forma natural de devolver o corpo à Deusa Mãe. A famosa gruta do Escoural no Alentejo, é um desses casos, tendo sido usada no Neolítico (5000-3000 a.C.) pelas comunidades de agricultores e de pastores como cemitério. Na gruta da Senhora da Luz, na zona de Rio Maior sabe-se que se fizeram enterramentos desde o Paleolítico Superior até ao Calcolítico.






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