quinta-feira, 12 de março de 2020

Machado Duplo, o antigo Labrys cretense

Achei curioso ter encontrado em Óbidos o Machado Duplo tão típico da cultura da Deusa cretense. Imagino que não seja nenhum exclusivo local, embora estes tenham inscrito o nome da vila na sua superfície. Aqui, como em outros lugares, ele é considerado uma simples arma de brincar, à venda no comércio local tal como arcos, flechas e espadas de madeira que por norma se oferecem às crianças sobretudo pela feira medieval de Julho...

MACHADO DUPLO - LOGOGRAFIA PARA MULHER

"O Machado Duplo, ou Labrys (ou Labirys) é um símbolo importante da Deusa Dupla, representando o poder sobrenatural multiplicado por dois, “o poder do dois” (ver Marija Gimbutas, A Linguagem da Deusa). Claramente, as duas lâminas, com a forma de meias-luas, do machado referem-se às fases crescente e minguante, nascimento e morte, e ao ritmo mensal do sangramento alinhado com a renovação permanente do ciclo lunar.
The Language of the Goddess, Marija Gimbutas

São estes crescentes evocando chifres, colocados de costas um para o outro, que formam o Machado Duplo das antigas culturas da Deusa, criando um dos primeiros e mais duradouros glifos da Deusa Dupla.
Machados duplos cerimoniais,
Museu Nacional de Arqueologia, Heraclion, Creta
Segundo Gimbutas, “O machado duplo da Idade do Bronze era na origem a representação duma Deusa da Morte e Regeneração com forma de ampulheta. Embora os linguistas tendam a achar que não, seguramente que a palavra Labyris tem relação com “lábia”, a qual por sua vez se relaciona graficamente com o conceito de Machado Duplo. Esotericamente, o conceito de Deusa Dupla como está expresso no Machado Duplo pode referir o clítoris e lábia de cada fêmea como o lugar do poder regenerador, lugar da sexualidade feminina multiorgásmica que evidencia a mulher como centro sagrado de todos os rituais devocionais tântricos. No seu livro sobre o papel da mulher nos ritos do Budismo Tântrico tibetano, June Campbell lembra-nos que OM MANI PADME HUM (“salvé, jóia no centro do lótus) é o mantra mais comummente recitado no Tibete. Chamando a atenção para o facto de este mantra ser dirigido a uma divindade feminina, Manipadma, Campbell reconstrói linguisticamente a expressão como sendo uma invocação da “divindade do clítoris-vagina”. Muito antes da invenção do “hieros gamos” (o casamento sagrado da masculino e do feminino), o Machado
Duplo foi um símbolo largamente difundido da qualidade dupla de cada mulher.

Complexo do Templo de Malia, Creta
Parece que o Machado Duplo seria a representação mais simples do corpo feminino, a ampulheta criada por dois triângulos unidos no centro (a cintura), uma logografia de mulher.
No seu trabalho inicial sobre a deusa, Marija Gimbutas enfatiza a forma de borboleta do machado, insistindo que "o emblema da Grande Deusa na sua origem nada tem a ver com o machado; ele antecede o aparecimento de machados de metal por vários milhares de anos. " Na Idade do Bronze fizeram-se machados na forma de borboleta (lâmina dupla) e, quando a "borboleta se tornou um machado duplo, a imagem da deusa como uma borboleta continuou gravada em machados duplos". A transformação de borboleta em machado é atribuída aos indo-europeus recém-chegados e à importância que eles atribuíram ao machado do seu deus do trovão, Zeus, para o qual este era sagrado, e que acreditavam estar imbuído de poder. No entanto, a borboleta como símbolo central da Deusa regeneradora remonta pelo menos ao sexto milénio a.C., onde ela encarna o princípio da transformação."

in Vicki Noble, The Double Goddess: Women Sharing Power

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