Achei curioso ter encontrado em Óbidos o Machado Duplo tão
típico da cultura da Deusa cretense. Imagino que não seja nenhum exclusivo
local, embora estes tenham inscrito o nome da vila na sua superfície. Aqui,
como em outros lugares, ele é considerado uma simples arma de brincar, à venda
no comércio local tal como arcos, flechas e espadas de madeira que por norma se
oferecem às crianças sobretudo pela feira medieval de Julho...
MACHADO DUPLO - LOGOGRAFIA PARA MULHER
"O Machado Duplo, ou Labrys (ou Labirys) é um símbolo
importante da Deusa Dupla, representando o poder sobrenatural multiplicado por
dois, “o poder do dois” (ver Marija Gimbutas, A Linguagem da Deusa).
Claramente, as duas lâminas, com a forma de meias-luas, do machado referem-se
às fases crescente e minguante, nascimento e morte, e ao ritmo mensal do
sangramento alinhado com a renovação permanente do ciclo lunar.
The Language of the Goddess, Marija Gimbutas |
São estes crescentes evocando chifres, colocados de costas
um para o outro, que formam o Machado Duplo das antigas culturas da Deusa,
criando um dos primeiros e mais duradouros glifos da Deusa Dupla.
Machados duplos cerimoniais, Museu Nacional de Arqueologia, Heraclion, Creta |
Segundo Gimbutas, “O machado duplo da Idade do Bronze era na
origem a representação duma Deusa da Morte e Regeneração com forma de ampulheta.
Embora os linguistas tendam a achar que não, seguramente que a palavra Labyris
tem relação com “lábia”, a qual por sua vez se relaciona graficamente com o
conceito de Machado Duplo. Esotericamente, o conceito de Deusa Dupla como está
expresso no Machado Duplo pode referir o clítoris e lábia de cada fêmea como o
lugar do poder regenerador, lugar da sexualidade feminina multiorgásmica que
evidencia a mulher como centro sagrado de todos os rituais devocionais tântricos.
No seu livro sobre o papel da mulher nos ritos do Budismo Tântrico tibetano,
June Campbell lembra-nos que OM MANI PADME HUM (“salvé, jóia no centro do
lótus) é o mantra mais comummente recitado no Tibete. Chamando a atenção para o
facto de este mantra ser dirigido a uma divindade feminina, Manipadma, Campbell
reconstrói linguisticamente a expressão como sendo uma invocação da “divindade
do clítoris-vagina”. Muito antes da invenção do “hieros gamos” (o casamento
sagrado da masculino e do feminino), o Machado
Duplo foi um símbolo largamente
difundido da qualidade dupla de cada mulher.Complexo do Templo de Malia, Creta |
Parece que o Machado Duplo seria a representação mais
simples do corpo feminino, a ampulheta criada por dois triângulos unidos no
centro (a cintura), uma logografia de mulher.
No seu trabalho inicial sobre a deusa, Marija Gimbutas
enfatiza a forma de borboleta do machado, insistindo que "o emblema da
Grande Deusa na sua origem nada tem a ver com o machado; ele antecede o
aparecimento de machados de metal por vários milhares de anos. " Na Idade
do Bronze fizeram-se machados na forma de borboleta (lâmina dupla) e, quando a
"borboleta se tornou um machado duplo, a imagem da deusa como uma
borboleta continuou gravada em machados duplos". A transformação de
borboleta em machado é atribuída aos indo-europeus recém-chegados e à
importância que eles atribuíram ao machado do seu deus do trovão, Zeus, para o
qual este era sagrado, e que acreditavam estar imbuído de poder. No entanto, a
borboleta como símbolo central da Deusa regeneradora remonta pelo menos ao
sexto milénio a.C., onde ela encarna o princípio da transformação."
in Vicki Noble, The Double Goddess: Women Sharing Power
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