Há uns tempos, dinamizei um workshop, incluído numa celebração de Beltane do Templo, cuja actividade central consistia na criação dum Lenço de Namorados, que é um artefacto muito da nossa tradição (mas não só), realizado em tempos pelas mulheres do Minho, mais precisamente de Vila Verde, para oferecem ao eleito do seu coração. A autora era muitas vezes uma rapariga do campo, pouco letrada, que sobre o tecido de linho bordava versos singelos, escritos em má ortografia (erros em que certamente o rapaz também não teria muitas condições de reparar…) e desenhos ingénuos.
Nunca esquecerei essa actividade tão sagrada, e ao mesmo
tempo divertida, e tenho o meu lenço de bolso pessoal religiosamente guardado
para ocasiões especiais.
E que ocasiões podem ser essas em que, em algumas partes do
mundo, como na Grécia actual, as mulheres continuam a usar os seus lenços de
bolso como símbolos sagrados e muito arcaicos do seu poder pessoal,
do seu poder de criar e de liderar?
Essa mão da Deusa, que por vezes ostenta uma decoração em forma de vulva, diz-nos a autora, remete precisamente para os Seus divinos poderes criadores e protectores. E a autora cita o exemplo da Grécia actual, com as suas danças tradicionais de mulheres em que este artefacto funciona para elas como um símbolo de poder pessoal e de liderança. A mulher que comanda os movimentos da dança, usa-o na mão e depois passa-o à mulher que a revezará nessa função. Na realidade, esse poder de dirigir a dança será partilhado pelo grupo de mulheres, e é através da passagem do lenço de mão para mão que essa partilha se concretiza:
“Na cultura da dança ritual feminina, toda a mulher deve ser capaz de orientar o círculo de dança no momento apropriado. Entre outras coisas, o seu lenço significa a sua disposição de assumir o papel de comando quando for a sua vez – na dança e na vida – e mostra que a sua comunidade pode contar com ela sempre que necessário. Desta forma, o lenço, sempre presente nas roupas folclóricas das mulheres, comunica os antigos valores europeus de apoio mútuo, responsabilidade coletiva e liderança partilhada que são tão centrais para a cultura da dança tradicional”.
E conclui:
“Quando dançamos as danças antigas, descodificamos os
símbolos sagrados e assumimos o papel de liderar, afirmamos o nosso próprio poder
inato de trazer um novo modelo de liderança a um mundo que precisa urgentemente
que avancemos nesse sentido. Quando conduzo a dança com um mandíli na
mão, sinto que estou hasteando uma bandeira esquecida de uma nação de mulheres
há muito perdida – mulheres que um dia souberam tecer, trabalhar e adorar
juntas, com confiança e alegria. E o mandíli afirma que ainda nos lembramos”.
Isto pode então dar aos Lenços de Namorados portugueses de
Vila Verde, no Minho, toda uma outra contextualização e sentido, e a questão
que surge é: Será que a ênfase actual no papel exclusivo deste item como um “lenço
de namorados” não espelha exatamente o que enquanto mulheres temos feito com o nosso poder pessoal na cultura onde vivemos?
Entretanto, muitas imagens de trajos tradicionais portugueses, como esta que aqui apresento, mostram-nos as mulheres usando lenços na cintura. Por certo eles são considerados apenas "de namorados", mas a verdade é que o seu significado parece ser bem mais arcaico e poderoso.
Tal como afirma a autora deste artigo, acho que vale muito a
pena resgatarmos o antigo e poderoso significado que as nossas antepassadas
deram um dia a estes artefactos sagrados da Deusa!
Poderá encontrar aqui o artigo original de Laura Shannon:
https://feminismandreligion.com/2023/02/09/womans-sacred-hand-and-handkerchief-by-laura-shannon/
*https://www.dailysabah.com/feature/2016/02/19/handkerchiefs-the-secret-language-of-love,
Imagem 2 https://www.sapatosnamorarportugal.com
Imagem 5: http://trajesdeportugal.blogspot.com
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